09/01/2025 às 17:52

ESPECIAL: Déficit de armazenagem preocupa diante da expectativa de safra cheia de grãos

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O Brasil enfrenta desafios históricos relacionados ao armazenamento agrícola e a projeção de uma safra de grãos cheia neste ciclo 2024/25 acentua a preocupação em relação ao déficit de estocagem. De acordo com o especialista no tema, Fabrício Hergert, gerente técnico de fábricas e grãos da Kemin, o quadro insuficiente de unidades armazenadoras combinado às condições climáticas tropicais do país elevam o risco de perdas consideráveis durante o armazenamento. No entanto, ele ressalva que boas práticas de armazenagem, combinadas com tecnologias modernas, podem mitigar esses problemas e preservar a qualidade dos grãos.

Dados do compêndio "A Perda de Grãos no Brasil e no Mundo: dimensão, representatividade e diagnóstico", elaborado pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) e publicado no ano passado, ilustram a gravidade do problema. Entre 2000 e 2020, a produção mundial de arroz, cevada, milho, soja e trigo somou 50,7 bilhões de toneladas, com o Brasil ocupando o 4º lugar entre os maiores produtores, respondendo por 6,2% da produção global. Apesar disso, perdas significativas na cadeia produtiva continuam sendo um desafio, com impacto econômico e energético, além de comprometerem a segurança alimentar global.

Apesar da significativa variação nos índices de perdas de grãos no mundo, o estudo aponta que, em média, 15% da produção mundial de grãos é perdida ao longo de toda a cadeia de abastecimento, desde a colheita até o consumidor final.

Em 2020, por exemplo, o estudo detalha que o Brasil teve uma produção estimada de 244,8 milhões de toneladas de arroz, milho, soja e trigo, que representaram naquele ano aproximadamente 95% da produção nacional de grãos. Se tomarmos como base esse percentual de 15% de perdas, o montante perdido no Brasil foi de 36,7 milhões de toneladas. Em termos monetários, na época isso representaria R$ 84,8 bilhões, o que equivalia à compra de 134,8 milhões de cestas básicas. Esses números demonstram a magnitude do desperdício e o impacto potencial que poderia ser evitado com o uso de boas práticas e tecnologias adequadas.

:: O problema no armazenamento

Hergert explica que, devido à falta de infraestrutura adequada e à obsolescência de muitas unidades armazenadoras, uma parcela considerável dos grãos é mantida em condições inadequadas, como a céu aberto. Essa prática, agravada pela alta umidade e temperaturas elevadas, favorece o crescimento de fungos e a produção de micotoxinas, compostos químicos nocivos que prejudicam a qualidade dos grãos e podem inviabilizá-los para o consumo humano e animal.

"As condições de armazenamento no Brasil não evoluem na mesma velocidade da melhoria genética dos grãos, que oferecem maior produtividade por hectare. Por isso, os cuidados no armazenamento são ainda mais necessários", ressalta o especialista.

:: Boas práticas e soluções tecnológicas

Entre as orientações técnicas, Hergert destaca o controle rigoroso de temperatura e umidade como práticas fundamentais. "A temperatura elevada aumenta a atividade metabólica dos grãos, promovendo aumento da respiração e a geração de dióxido de carbono, o que acelera a deterioração e a proliferação de fungos", alerta.  Além disso, o uso de aditivos antifúngicos, é essencial para garantir a conservação dos grãos em condições adversas.

Já Giordania Tavares, CEO da Rayflex, empresa especializada na fabricação de portas rápidas para a indústria de armazéns, reforça que a ausência da armazenagem correta pode ampliar os prejuízos relacionados à perda de qualidade e ao desperdício de grãos.

“A falta de armazéns qualificados gera estresse nas cooperativas, agricultores e cerealistas, de modo que a solução mais rápida acaba sendo os piscinões a céu aberto, que aumentam o custo extra e são mais propícios à proliferação de microorganismos”, comenta Giordania.

Para a executiva, o descompasso entre o tamanho da produção e a capacidade de armazenagem não permite o controle correto como nos silos, instalações que são devidamente projetadas para a gestão adequada de situações relacionadas à fungos e insetos que chegam da lavoura e podem afetar diretamente as sementes. “Após a colheita, grãos como a soja continuam vivos e, por respirarem, aquecem. Em determinados gradientes de temperatura, há a proliferação acentuada de fungos e o aumento da ação de insetos. Hoje, sabe-se que grãos submetidos a temperaturas abaixo de 17°C têm maior resistência quanto à deterioração provocada por esses tipos de agentes contaminantes, por isso, é crucial ter um armazém onde pode-se controlar a temperatura”, explica.

Ainda no que diz respeito à temperatura e umidade do ambiente de estocagem, a CEO da Rayflex, alerta que o feijão também possui características que necessitam de atenção no processo de estocagem. “No caso do feijão, a variação da qualidade é bem sensível ao armazenamento, pois, em sua composição há dois tipos de água, sendo elas a livre e constituída. A primeira é facilmente eliminada pelo calor, enquanto a segunda está fortemente ligada às células. Devido à capacidade de ceder e reter água com o ar que envolve o grão, a variação no  ambiente em que está estocado interfere diretamente na qualidade final do produto, que pode sofrer modificações na cor e até tornar-se mais duro. A recomendação é que a umidade do ar não ultrapasse 13%”, esclarece Giordania.

Segundo a executiva, a armazenagem do pós-colheita pode ser ainda mais segura e funcional nos silos por meio do uso de equipamentos tecnológicos como portas rápidas, que são ideais para a movimentação eficaz, reduzindo a vulnerabilidade aos ventos, chuvas e outros agentes contaminantes. “Esse tipo de solução oferece vedação completa e, além de contribuir com a higiene do estoque, auxilia na redução da contaminação biológica de produtos alimentícios como os grãos”, comenta.=

Giordania destaca que a agricultura brasileira é uma das mais prósperas do mundo e por isso, o uso de tecnologias e programas como o PCA - Plano de Construção de Armazenagem e o Moderinfra, que podem ser usados para instalação de novos armazéns, devem ser ainda mais incentivados pelo desenvolvimento no setor. “Ampliar a capacidade estática, a recepção e a expedição de produtos, além de melhorar o sistema de pesagem, amostragem e segurança, fazem parte dos próximos desafios para valorizar ainda mais o nosso produto de exportação mais importante”, finaliza.
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