04/02/2025 às 11:04
Valorização das paisagens alimentares impulsiona turismo rural sustentável no Nordeste
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Comunidades tradicionais de Alagoas, Pernambuco e Sergipe se reuniram na semana passada, em Maceió, durante o workshop de governança turística sustentável do projeto Paisagens Alimentares, coordenado pela Embrapa Alimentos e Territórios, Financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), com foco no desenvolvimento do turismo de base comunitária, o projeto foi realizado a partir de 2022, buscando a valorização ambiental e social dos territórios selecionados.“As paisagens alimentares são espaços geográficos que contam a história do território, do ponto de vista da integração entre pessoas e saberes tradicionais, símbolos e significados, que fazem parte dos patrimônios cultural, agrícola, alimentar e ambiental”, explica o coordenador do projeto de inovação social, Aluísio Goulart. Segundo ele, “as paisagens alimentares evidenciam as funções paisagísticas, ambientais e sociais da agricultura, que podem ser compartilhadas por meio do turismo sustentável”.Para a secretária-executiva da Secretaria Estadual de Turismo (Setur), Marília Herrmann, houve uma mudança no perfil do turista após a pandemia, mais interessado em conhecer o modo de vida das pessoas visitadas. Ela destacou as ações do governo de Alagoas para apoiar as comunidades, incentivando o turismo gastronômico e sustentável de base comunitária. “Estamos fazendo um trabalho conjunto com as secretarias de Desenvolvimento e da Agricultura para inserir os produtos rurais e agrícolas nos hotéis e restaurantes e fomentar esse turismo de experiência”, afirmou.Manuela Lourenço, superintendente de Políticas para a Igualdade Racial, da Secretaria Estadual da Mulher e dos Direitos Humanos (Semudh), defende que é importante refletir sobre os desafios na valorização dos territórios. Um deles é a monocultura presente na região, como a da cana-de-açúcar, num contraste com a diversidade da produção agrícola apresentada pelas comunidades durante o evento. Ela ressaltou a necessidade de se ampliar as parcerias com o governo, a Embrapa e os povos tradicionais, para fortalecer esse processo de valorização dos saberes tradicionais.Sobre as ações desenvolvidas pela Embrapa, João Flávio Veloso Silva, chefe-geral da Embrapa Alimentos e Territórios, falou sobre o foco em valorizar a cultura alimentar, numa abordagem nova na história da Empresa. “Vocês estão nos ajudando a construir conceitos e referências que serão fundamentais para a atuação da Embrapa do futuro”, enfatizou. Veloso ainda salientou a importância da manutenção da Rede Territórios de Saberes e Sabores, criada pelas comunidades nordestinas em 2024.:: Riquezas alimentares e culturaisRepresentantes dos territórios integrantes do projeto expuseram suas histórias e produtos. Anatalia Neta, Joaninha dos Santos e Vanessa dos Santos representaram os Povoados de Pontal, Preguiça e Terra Caída, em Indiaroba (SE). Vanessa falou com orgulho do ofício das catadoras de mangaba, Patrimônio Cultural Imaterial de Sergipe, e das práticas ancestrais das marisqueiras, além das riquezas alimentares e culturais da região. Também abordou a variedade de produtos e receitas à base de mangaba e de aratu, alimentos típicos locais.O território de São Cristóvão (SE) foi representado por Maria Reis, Simone de Souza, Vânia Fontes e Vera Maria Gomes. Vânia destacou a mandioca, o coco e o açúcar como os principais ingredientes da cultura alimentar. Os biscoitos bricelets e as queijadas lá produzidos também são patrimônios imateriais sergipanos, reconhecidos pelo modo de fazer transmitido por gerações. As comunidades ainda se dedicam ao artesanato, com o reaproveitamento de materiais, contribuindo para a preservação do meio ambiente.As ações desenvolvidas no Assentamento Nova Esperança, em Olho d’Água do Casado (AL), foram ressaltadas por Ana Paula Ferreira. Entre elas, houve diversas oficinas de capacitação, como a de economia criativa, oferecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que incentivou a produção de artesanato com motivos rupestres. Os trabalhos de educação ambiental e a criação de mapas temáticos relativos à biodiversidade da caatinga também foram apontados como exemplos de reconhecimento e valorização das práticas tradicionais.Salete Barbosa, da Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa (Coopcam), em Palmeira dos Índios (AL), lembrou que as conversas com a Embrapa começaram em 2018. Com consultorias do Sebrae e apoio de outras Unidades, como a Embrapa Semiárido, os cooperados estão aperfeiçoando os processos de produção, especialmente dos derivados de jabuticaba, e diversificando seus produtos. As capacitações os levaram a “descobrir muitas outras coisas no território”, segundo ela. Com isso, os agricultores já estão pensando em inovar os roteiros turísticos, beneficiar novos produtos e expandir os trabalhos com sementes crioulas.A Associação das Marisqueiras de Sirinhaém (Amas), representada por Cícero Silva, Eliane Silva e Viviane Wanderley, localiza-se na Área de Proteção Ambiental Guadalupe, em Sirinhaém (PE). As marisqueiras são guardiãs dos saberes e fazeres tradicionais da pesca artesanal. Lá os turistas têm a oportunidade de vivenciar as experiências de adentrar o manguezal para coleta de crustáceos, especialmente o aratu, além de provar as delícias culinárias preparadas por essas mulheres, como os típicos caldinhos de aratu e sururu.Também localizada na APA Guadalupe, a Associação da Comunidade Quilombola do Engenho Siqueira (Acqes), reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial de Rio Formoso (PE), agora consegue ter mais acesso a políticas públicas para alimentação. A Acqes, representada por Amara Magaly da Silva, Cláudio Pageú e Rodney da Silva, está oferecendo alimentos agroecológicos para a merenda escolar, por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Além disso, está conseguindo participar de editais de projetos voltados para o turismo de base comunitária. “Essa parceria foi além do projeto; ela trouxe outros complementos que fortalecem ainda mais a nossa comunidade”, disse Pageú.:: Sabores, Saberes e Governança TurísticaA programação contou ainda com a palestra Conexões entre Sabores, Saberes e os Territórios, proferida por Isabela Barbosa, professora da Uninassau. Turismo em Paisagens Alimentares foi o tema da apresentação de Richard Alves, da empresa Lab Turismo, que atuou no projeto. Governança e a Rede Territórios dos Saberes e Sabores foram abordados pelo professor Carlos Costa, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), instituição parceira do projeto, e por Lydayanne Nobre, bolsista da Fundação de Apoio à Pesquisa e ao Desenvolvimento (Faped).Durante o workshop, Aluísio Goulart também expôs os pilares de um modelo de Governança Sustentável em Paisagens Alimentares. A superintendente de Infraestrutura Logística para o Turismo da Setur de Alagoas, Sandra Villanova, apresentou as ações de Governança Turística em Alagoas. Os princípios para a construção de um Plano de Conservação Dinâmica das Paisagens Alimentares foram abordados pelo pesquisador da Embrapa João Roberto Correia. E os desafios para a Governança Turística foram tema da palestra do pesquisador Renato Manzini, atualmente na Embrapa Agroindústria Tropical, que desenvolveu uma abordagem metodológica sobre o assunto.Na visão de Ricardo Elesbão, chefe de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Embrapa Alimentos e Territórios, os resultados obtidos são fruto de uma construção coletiva, principalmente com a agregação das comunidades e das empresas e instituições parceiras. Ele reforçou a importância da continuidade dessas ações, lembrando que o desenvolvimento territorial também depende de políticas públicas e de uma atuação conjunta dos estados, municípios e das comunidades envolvidas.
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